Começamos por falar do protagonista desta estória um bocadinho maluca: o nosso querido pero (ex pêro AO).

Sabiam que o pero é… uma fruta?! Nada a ver com uma conjunção adversativa! E, ainda diria mais, uma fruta galega quando menos no feminino! ;P

Um pereiro é uma árvore de fruta que dá peros (AO: pêro). Ou assim é que dizem as pessoas que disso das árvores sabem…

Segundo relata o blogue Saberes Cruzados:

A referência mais antiga na qual se nomeiam peros data de cerca de 1496, onde se aconselha a que: “se evitem todos os frutos se não forem azedos, assim como são cerejas, romãs, ou um pequeno de pêro ou maçã em lugar de mezinha, porque todo o fruto traz podridão” (MACHADO, 2010).
Refere também um outro livro de 1512 intitulada «Tratado sobre a província de Entre Douro e Minho e suas abundanças» onde se refere haver nesta “todas as maneiras de fruta” como “maçãs, pêros, pêras de todas as castas que se possam achar” (RIBEIRO, 1959).

E continua ainda:


«É também sabido que em 1552  Lisboa era abastecida por “nozes e avelãs e pêros e gamelas de pau” provenientes da Galiza (BRANDÃO, 1990: 58).
Duarte Nunes do Leão, na sua obra «Descrição do Reino de Portugal» também refere os pêros: “de Montemor-o-Novo sai a enchente dos pêros de Rei que é a mais nobre fruta que todas as castas de maçãs porque além de virem quando a outra fruta se acaba são de suave cheiro e mui cordiais, que se não dão em outra parte de Espanha; e por sua excelência se chama de Reis. os excelentes e muitos pêros verdeais que para doentes enfastiados se buscam, se dão nas terra da Beira, donde os trazem a Lisboa e à corte para gente mimosa; os quais além de serem saborosíssimos duram de um ano para outro”, acrescentando que “a Beira terra mais fresca por ser regada de muitas águas, tem (…) pela frescura dos ares, muitas frutas de várias maneiras: principalmente os seus pêros verdeais (LEÃO, 1610: 62, 62v e 66v). Bluteau explicita o significado de verdeal/verdeais: “é um pêro grande, compridinho e azedo. Chama-se verdeal porque a casca mete a verde. Apanha-se mais tarde que a outra fruta e dura mais, e melhor será depois de lhe gear em cima” (BLUTEAU, 1712-1728).»

O pêro na ilha da Madeira

Continuam ainda no nosso blogue de referência Saberes cruzados:


Gaspar Frutuoso, em «As saudades da Terra», obra escrita na segunda metade do século XVI, refere os pêros dos pomares da Ribeira Brava – “muito ricos de muitos pêrose pêras, nozes e muita castanha” – bem como os pêros de Santa Cruz e do Faial, sendo que nesta última localidade existia – “muita fruta de espinho, de cidras e limões; pêras, pêros e maçãs e noz” (FRUTUOSO, 2007: 94, 78 e 99).
Muitos séculos passados, no «Elucidário Madeirense», cuja primeira edição data de 1921, descreve-se o pereiro da seguinte maneira: “Pereiro (Pyrus Marus [sic] subesp. Hortensis). Rosacea-Pomoidea europeia, de ordinário arbustativa, muito cultivada na Madeira. A macieira é uma das muitas variedades hortenses desta espécie, distinguindo-se facilmente do pereiro pelos seus pomos achatados e providos duma massa mais fina e de sabor mais agradável. As melhores maçãs vêm da Camacha, de Santo António da Serra e doutras localidades altamente situadas da ilha, ao passo que os pêros se encontram por toda a parte, sendo alguns deles bastante saborosos depois de maduros. O pêro-vime, o pêro-estopa, o pêro-doce, a maçã-barral, a maçã-reineta, a maçã-cara-de-cama e a maçã-pino-de-ouro, são as variedades mais conhecidas na Madeira. Outrora preparava-se com o sumo ou mosto dos pêros ou das maçãs muito vinho que era vendido aos consumidores como vinho de uvas; hoje é proibida a vinificação desses frutos, mas pode fabricar-se com eles a cidra, bebida agradável e de que se faz largo consumo em muitos países” (ELUCIDÁRIO MADEIRENSE, 1978 [1940], III).

Em 2006, o Engenheiro Agrónomo Rui Vieira informa que “no arquipélago da Madeira, a macieira (a que chamam pereiro, quando se trata de certas variedades, como muitas regionais, que são bastante rústicas e geralmente com os frutos alongados a oblongo-cónicos) é, também, uma planta frequente em todos os concelhos, aparecendo, como exemplares dispersos ou em pequenos pomares, sobretudo nas zonas de média altitude, acima dos 300m e até mais de 900m e, mais raramente, em altitudes inferiores, sobretudo, na costa norte da Ilha maior e, entre 100 e 200m, na ilha do Porto Santo”(http://www.sir-madeira.org/WebRoot/Sir/Shops/sir-madeira/4725/C3B8/CBEA/B910/6992/C0A8/000A/0407/Macieira.pdf).
O pêro é desde há muito utilizado na Madeira para fazer sidra (“vinho de pêros”), mas com pouco expressão comercial.

Há vários anos que se organiza, em Setembro, a «Festa do Pêro», na Ponta do Pargo, e a «Mostra da Sidra» no Santo da Serra. São festas a não perder e que seguramente contribuem para manter arraigados o cultivo e o consumo do pêro madeirense.

Assim que força e programem uma viagem para alguma destas festas!

Já depois compartilharemos as fotografias e as anedotas que queiram por aqui.

Até a seguinte, malta! 😛

Bibliografia:

  • BLUTEAU, 1712-1728: Rafael Bluteau – Vocabulario Português e Latino…. 10 vol. Coimbra: Colégio das Artes da Companhia de Jesus, 1712-1728.
  • BRANDÃO, 1990 [1552]: João Brandão – Grandeza e abastança de Lisboa em 1552. Lisboa: Livros Horizonte, 1990.
  • DICCIONARIO, 2001: Diccionario de la lengua española. 2 vol. 22.ª ed. Madrid: Espasa Calpe, 2001
  • ELUCIDÁRIO MADEIRENSE, 1978 [1940]: Fernando Augusto da Silva; Carlos Azevedo de Meneses – Elucidário Madeirense. Fac-símile. 3 vol. 4.ª ed. Funchal: Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1978. 1.ª ed., 1921
  • FRUTUOSO, 2007: Gaspar Frutuoso – As saudades da Terra: fac-símile. Funchal. Empresa Municipal Funchal 500 anos, 2007.
  • LEÃO, 1610: Duarte Nunes de Leão – Descrição do Reino de Portugal. Lisboa: Impresso com licença de Pedro Rodrigues, 1610.
  • MACHADO, 2010: José Barbosa Machado (ed.)– Regimento Proveitoso contra a Pestenença. Braga: Edições Vercial, 2010.
  • RIBEIRO, 1959: Luciano Ribeiro – Uma descrição de Entre Douro e Minho por mestre António. Boletim Cultural. Câmara Municipal do Porto. Porto. 22: 3-4 (1959). 441- 460
  • https://saberescruzados.wordpress.com/tag/pero/
  • https://www.estraviz.org/pero
  • https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/consultorio/perguntas/a-diferenca-entre-maca-e-pero-de-novo/16375
  • http://perodecehegin.es/Caracteristicas_del_pero_de_alcuza.html

4 thoughts on “O que é que é, afinal, o PERO?

  1. Tanto a maçã como o pêro pertencem à família das rosáceas, havendo muitas variedades. Contudo trata-se do mesmo fruto, simplesmente atribuíram-se nomes distintos quanto à forma, sendo maçã com maior diâmetro e menor altura e pêro o contrário; isto quando seu (deles) pedúnculo estiver sobreposto a uma superfície plana e horizontal.

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